António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Quando for grande quero ser…

Dezembro 12th, 2020

Mas, para meu azar, ou sorte, a minha profissão depende, quase em absoluto, da Internet.

Eu tento. Juro que tento. Já a minha mãe dizia entre dentes e de olhos arregalados: “‘Tá calado…”

Trabalho com seis redes sociais abertas em simultâneo e inúmeras plataformas digitais. Portanto, por muito que me desvie, levo com o disparate em cima e o meu armário dos estereótipos vai ficando cheio. E, enquanto outros saem do armário, eu entro no meu cheio de orgulho.

Hoje dei por mim a contemplar a prateleira onde tenho as ocupações (ou profissões, num acesso de bondade) da moda, a saber: Intelectual, Activista e Influencer. Haverá mais, certamente, mas com estes eu esbarro vezes de mais.

Mas isto são profissões? São, ou dizem que são, ou querem que acreditemos que são. Vamos esmiuçar.

Que raio faz um Intelectual?

Calma. Eu sei o que é um Intelectual. É alguém que produz, edita e publica pensamento sobre determinadas temáticas, nas quais é especialista, seja por formação académica, seja por experiência profissional (lá está… a profissão é outra…). Mas, um verdadeiro Intelectual, não se assume como tal. 

Há tempos, ao entrar num conhecido blog, noto que a autora se apresenta como “Intelectual”. O mesmo acontece nos sites de alguns partidos políticos, onde os respectivos titulares de órgãos internos, têm o campo “Profissão” preenchido com a palavra “Intelectual”. 

Este Intelectual da moda intitula-se intelectual. Basicamente, está a dizer que não faz nada, não sabe fazer nada, mas tem coisas muito interessantes a dizer. Mentira, por norma só diz disparates, coloca sempre o restante CV na assinatura, (normalmente recheado de pós-graduações duvidosas), mas com toda a convicção de quem está a postular a Teoria da Relatividade. É mais ou menos o que eu faço em certas crónicas que escrevo. Confesso. 

Se, alguém assumir-se como intelectual é, simplesmente, snob e uma tentativa desesperada de dizer “preciso de um emprego a sério”, alguém definir-se como Activista é isto:

“Portanto, tipo, aqui estou eu, tipo no meu pedestal de pessoa super preocupada, tipo, com bué de cenas, tipo super importantes, tipo para o futuro, tipo dos nossos filhos, enquanto vocês comuns-mortais-não-activistas, estão tipo a destruir o planeta e tipo as minorias, que merecem os mesmos direitos, tipo que nós.”

(eu queria escrever “tsipo” para ser mais realista, mas o corrector automático agrediu-me)

Este é o Activista-Influencer, uma mescla destas novas… ocupações. Na verdade, não está preocupado com nada, a não ser ter likes. Fotografa-se em manifs, a plantar árvores, a alimentar animais, mas sempre de olho nas notificações. #hipocrita

O Activista acha que os restantes comuns-mortais-não-activistas não têm cérebro e então está permanentemente a dizer-nos como agir, pensar e sentir. Mais, se caímos no erro de não agir, pensar e sentir segundo os cânones que preconiza, recorre ao seu melhor e, muitas vezes único argumento, o insulto. E quando consegues provar, com factos, que está errado? Entra em modo papagaio repetindo a mesma coisa até nos cansarmos dele e virarmos costas. 

Há também aquele Activista que está sempre zangado, mal disposto. Que protesta sempre pelos mesmos dois motivos: tudo e nada. É incapaz de rir, ser feliz. Defende a Natureza, mas não sabe apreciar a sua beleza. Defende as minorias, mas é alguém com uma enorme dificuldade em se relacionar com outros seres humanos. E a sua maior habilidade é ver problemas onde eles não existem.

Calma, pá. Eu sei que o activismo é importante, pá. Cresci nos anos 80, pá. Na altura, pá, os EUA e a URSS, pá, tinham grandes mísseis nucleares apontados uns aos outros e, segundo as previsões mais optimistas, pá, por esta altura o Mundo já tinha acabado num enorme cataclismo nuclear, pá.

Por fim, uma das grandes pragas do século XXI: os Influencers. Uma imensa ode à futilidade, ao consumismo, ao facilitismo. A entronização do banal e da mediocridade. Pessoas ocas, que metidas numa Moulinex, nem uma colher de chá de sumo produziam.

Os Influencers são a degradação do conceito de Líderes de Opinião. Vamos imaginar que, se um Lider de Opinião for um Ferrari, um Influencer é um carrinho de rolamentos falsificados na China, enferrujados e sem lubrificação.

Na verdade, tenho saudades dos líderes de opinião, mesmo daqueles com quem não concordava. Era desafiante e estimulante ouvir, ler, pessoas plenas, com conteúdo, esses sim, verdadeiros Intelectuais, Activistas do pensamento, Influenciadores de vidas. Pessoas com valor acrescentado.

Mas “hoje não há líderes de opinião, há influencers do activismo.”

Há Intelectuais-Activistas, Intelectuais-Influencers, Activistas-Influencers e Intelectuais-Activistas-Influencers, os supra-sumos. Mas de laranjas muito sequinhas, muito sequinhas…

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.