António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

“Alda” – Francisco Marques Neto

Agosto 10th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

Todas as bandas terão as suas histórias que passam de geração em geração, repetidamente contadas até por quem não as vivenciou.

Em Crestuma, um dos relatos mais famosos falava do célebre concerto nocturno em S. Mamede de Ribatua, em que, durante a execução da “Alda”, aluz do palco apagou-se, continuando a banda a tocar a obra até ao final.

A “Alda” era uma obra “de bandeira” na Sociedade Filarmónica de Crestuma, muito pelo virtuosismo do seu naipe de clarinetes: António Moreira Jorge, António Mota, José Moura e o recentemente falecido Vitor Ribeiro.

Uma execução que saía das entranhas dos músicos e do maestro, à época, Joaquim Costa, tendo sido registada na primeira edição fonográfica, em K7, da banda. E eu ainda tive o prazer e a honra de a tocar durante, sensivelmente, duas épocas.

Não havendo no Youtube esse registo, partilho na mesma uma interpretação do Maestro Joaquim Costa, à frente da Banda de Carregosa, numa gravação da Afinaudio.

A filarmonia é muito isto. As melhores obras serem aquelas que nos fazem viajar no tempo.

E se, nos arquivos das vossas bandas, tiverem a “Alda”, toquem-na. É demasiado bela para ficar num armário.

À memória de Vitor Ribeiro.

 

“El Camino Real” – Alfred Reed

Agosto 9th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

 

Ainda me lembro do entusiasmo que esta obra provocou quando começou a ser tocada nas bandas filarmónicas portuguesas, principalmente entre os trompistas…. vá-se lá saber porquê…

“El Camino Real” abriu portas para um leque de compositores e reportório que se entendiam quase como inacessíveis, impossíveis, ou desadequados ao ambiente de romaria.

A verdade é que esta fantasia latina, vinda dos EUA, acaba por ser uma boa “espanholada” e todos sabemos como as “espanholadas” soam bem nas nossas bandas.

É claro que tem uma instrumentação “ambiciosa”, nem toda a gente pode andar com vibrafones e afins atrás, mas toca-se e toca-se bem.

Muito mérito do compositor e na deliciosa combinação de timbres que faz. Aqui há anos eu comentava com alguém que identificamos facilmente as obras de Reed pelo timbre.

Foi encomendada e dedicada à 581ª Banda Força Aérea Americana (AFRES) e  ao seu comandante, o tenente-coronel Ray E. Toler. Composta na segunda metade de 1984 e concluída no início de 1985, inclui o subtítulo: “Uma fantasia latina”.

A peça é baseada numa série de progressões de acordes comuns aos grandes guitarristas de flamenco (e outros), que conferem um carácter intrinsecamente espanhol à obra. A primeira seção da obra é baseada na forma de dança conhecida como “Jota”, enquanto a segunda seção, contrastante, é derivada do Fandango, mas aqui alterada consideravelmente tanto no tempo quanto no andamento de sua forma usual. No geral, a música segue um padrão tradicional de três partes: rápido-lento-rápido.

A primeira apresentação pública de “El Camino Real” aconteceu no dia 15 de abril de 1985 em Sarasota, Flórida, com a 581ª Banda da Força Aérea sob a direção do Tenente Coronel Ray E. Toler.

Convosco partilho a interpretação da Banda de Paços de Ferreira, sob a direcção de Alexandre Coelho, num registo de Damião Silva.

 

“O Barbeiro de Sevilha” – Rossini

Agosto 8th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

A abertura da ópera “O Barbeiro de Sevilha” foi a primeira obra clássica que o meu pai me apresentou. Teria eu uns 4 ou 5 anos, já sentia uma certa atracção por aqueles clássicos mais “orelhudos”, tipo “Guilherme Tell” ou “Orfeu nos Infernos”, mas não lhes conhecia o título. O “Barbeiro” teve direito a apresentação oficial.

Ele coloca o vinil a tocar e, a dada altura, diz-me:

– Esta é “O Barbeiro de Sevilha”, queres ver?

Acto contínuo, o meu pai começa a cantar uma letra da sua autoria em cima da primeira melodia do “Allegro”:

Ai! Faz-me a barba!

Ai! Faz-me a barba!

Ai! Faz-me a barba!

e corta-me o cabelo…

(imaginem se conseguirem…)

Anos mais tarde viria a tocá-la na Banda de Crestuma, na Marcial de Fermentelos e na Banda Visconde de Salreu. Terei tocado esta obra em mais algum lado? Talvez.

Il barbiere di Siviglia, Alma Viva o sia l’inutile precauzione (O barbeiro de Sevilha, Alma Viva ou a inútil precaução) é baseado na comédia Le Barbier de Séville, do dramaturgo francês Pierre Beaumarchais (livro que fiz questão de ler quando comecei a tocar a obra).

Esta famosa abertura foi composta originalmente para outra obra do compositor, “Aureliano in Palmira”, e usada posteriormente em “Elisabetta, regina d’Inghilterra”.

Rossini era bom nestas coisas de despachar expediente.

Quem também é muito bom nestas coisas dos arranjos é Franco Cesarini, cujo arranjo abaixo escutamos, pela Banda Comércio e Indústria das Caldas da Rainha.

 

“Carnaval de Veneza” – Jean-Baptiste Arban

Agosto 7th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

O “Carnaval de Veneza” é baseado em uma melodia folclórica napolitana chamada “O Mamma, Mamma Cara”, aquela que, quando éramos miúdos, aprendemos como “O meu chapéu tem três bicos…” (de vez em quando o Herman José canta a versão em alemão “Mein Hut, der hat drei Ecken”)

O violinista e compositor Niccolo Paganini escreveu vinte variações da melodia original, que intitulou de “Il Carnevale Di Venezia”, Op. 40. Em 1829, ele escreveu a um amigo: “As variações que compus sobre a graciosa cantiga napolitana, ‘O Mamma, Mamma Cara’, ofuscam tudo. Não consigo descrever.”

Desde Paganini, muitas variações sobre o tema foram escritas, principalmente as de Jean-Baptiste Arban, para trompete solo, contendo exibições virtuosas de duplo e triplo staccato.

Em Portugal, tornou-se uma obra mítica no reportório filarmónico graças à interpretação de Jorge Almeida, colocando num patamar olímpico as peças solísticas virtuosísticas.

Aliás, há um antes e um depois de Jorge Almeida. Há um antes e um depois do “Carnaval de Veneza”.

E aqui fica  o próprio, com a Banda de Fajões, sob a direcção de Américo Nunes.

P.S. – A propósito deste género de reportório, recordo também a “Fantasia do Minho”, de Afonso Alves, a qual, original para bombardino, foi também adaptada ao trompete de Jorge Almeida.

 

“Portugal a Cantar” – Manuel Ribeiro da Silva

Agosto 6th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

 

E mais uma da série Ribeiro da Silva.

A meu ver “Portugal a Cantar”, juntamente com “Desfolhando Cantigas” e “Aguarela Popular”, formam a trilogia perfeita daquilo que é uma rapsódia com “R”.

São obras com som, cor e cheiro, que mexem com todos os nossos sentidos. Ao ouvi-las, viajamos automaticamente para uma qualquer romaria entre Douro e Minho, concerto da noite, arcos iluminados, a igreja decorada, cheiro a pipocas e bifanas, luar de Agosto, casacos nas costas das cadeiras.

O trompetista que ainda tem lábio para mais um solo, a outra banda que vai descendo do coreto para a despedida. É o dar tudo até ao fim, porque nem só de calhaus vive o homem.

A nostalgia filarmónica… a nostalgia popular… “a Festa da Senhora da Agonia e o cansaço…”

De todos os textos escritos para esta rúbrica este será o mais escasso, porque há emoções que não se escrevem.

“Portugal a Cantar”, num registo atribuído à Banda da Trofa, mas não posso afirmar com exatidão que o seja.

“Galáxia” – Amílcar Morais

Agosto 5th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

Tirem-me uma dúvida… a “Galáxia” faz parte da série “Pop Show”?

Quase tudo o que disse, há tempos sobre o “Pop Show 4”, podia ser aplicado a este monumental medley pop-rock de Amílcar Morais.

Durante muito tempo, tocar “ligeiros” era sinónimo de tocar Amílcar Morais, pioneiro neste tipo de composições para o universo filarmónico lusitano.

Se, a meu ver, o “Pop Show 4” terá sido a mais pop das suas pops, a Galáxia virá logo a seguir.

Há quanto tempo não ouvimos isto? Quase vinte minutinhos para recordar com saudade.

Interpretação da Orquestra Municipal de Águeda, dirigida por João Neves.

 

“La del Soto del Parral” – Reveriano Soutullo Otero e Juan Bautista Vert Carbonell

Agosto 4th, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

 

“O que torna a obra especial não é o arrojo da composição ou a espectacularidade da sua orquestração. É a simplicidade das suas melodias que não deixa nenhum ouvinte indiferente.”

Uma espanholada das antigas e das boas, dos mesmos autores da já exposta “Lenda do Beijo” e que merecia ser mais tocada.

Zarzuela em dois actos, divididos em três quadros, seguindo os padrões normais dos dramas rurais e na qual os compositores deixam um pouco de parte o estilo de opereta, característico das obras anteriores, para aproximar-se dos costumes rurais, criando uma partitura marcadamente lírica, com certas influências do verismo italiano, que vinha ganhando força à época, sem perder o espírito espanhol que permeia toda a obra.

Sou suspeito… mas aqui fica a magistral interpretação da Marcial de Fermentelos, sob direcção de Hugo Oliveira, num registo Afinaudio.

 

“O Melro Branco” – Eugène Damaré

Agosto 3rd, 2021

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS

4ª Temporada – “Procura aí o papel…”

 

 

O reportório solístico para banda filarmónica costuma ser uma “faca de dois legumes”. Por um lado, enriquece um programa e é uma boa maneira de encostar a banda oponente às cordas num despique. Por outro, pode trazer problemas internos, na chamada “gestão do grupo de trabalho”.

E, a meu ver, há ainda outra questão: há maestros que não têm a noção de como dirigir uma obra solística. Em primeira instância, a peça “a solo” é sempre do solista. Por isso faz-me confusão interpretações deste género de reportório em que a banda se sobrepõe ao solista ou, pior ainda, o maestro se sobrepõe ao solista.

O “Melro” será caso paradigmático deste fenómeno quando há maestros que impõem andamentos absurdos à interpretação da mesma. Fica difícil para a banda, fica difícil para o solista e o resultado final é desastroso. Digo eu, que já lá estive.

Considerações estilísticas à parte, sou totalmente apologista de obras solísticas nas bandas e trarei mais a este espaço, ainda nesta temporada.

O flautista francês Eugène Damaré nasceu em Bayonne e ganhou uma reputação considerável também como virtuoso no flautim. Prolífico como compositor, especialmente de peças de todos os tipos para seus próprios instrumentos. Escreveu também um método de flauta, com um suplemento para flautim e estudos. Faleceu em Paris em 1919. “Le Merle Blanc – Polka Fantaisie op.161” foi uma das suas mais famosas obras, sendo original para flautim e piano e tendo conquistado um lugar de destaque no reportório filarmónico nacional.

Aqui fica na leitura da Banda da Foz, dirigida por Jorge Macedo, sendo solista a Teresa Sala (uma miúda muito gira!). A filmagem é minha.

 

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.