António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Deolinda: o grito de revolta de Portugal!

Fevereiro 24th, 2011

A canção dos Deolinda “Parva que eu sou”, goste-se ou não, é um retrato fiel deste país. Infelizmente, mas é.
E pior que não ver a realidade é negá-la.

Preferia 1000 vezes que não fosse necessária esta música… mas é! E ainda bem que ela veio!!!

Portugal é um país que incentiva as pessoas a formarem-se para depois lhes bater com as portas ou para as explorar e escravizar e já era altura de alguém dizer isto a plenos pulmões!

Porque é que centenas (ou até milhares) de talentos, artistas, cientistas, verdadeiros cérebros, fogem todos para o estrangeiro? Por causa da realidade exposta nesta música!

Quem diz que não gosta da canção, ou atira com o demagógico “façam-se à vida”, provavelmente nunca teve que estagiar de borla, ou pagar para trabalhar;

– provavelmente nunca teve que enfrentar um, dois, três despedimentos, com a entidade patronal a alegar “a crise”;

– provavelmente nunca teve que ver descerebrados, desqualificados e incompetentes graxistas a subirem na carreira, enquanto os competentes, os trabalhadores, os empenhados iam ficando com mais trabalho e menos salário, até ao dia em que o despedimento lhes bate à porta.

Quem diz que não gosta da canção, ou diz “parem de choramingar”, provavelmente nunca teve que chorar a contar os tostões para meter uns pneus novos no carro ou para comprar umas calças novas.

Quem diz que não gosta da canção é porque não a percebe, ou não quer perceber.
– provavelmente tem papás ricos, que lhe arranjaram um bom tacho numa empresa do tio;

– nunca teve que percorrer páginas e páginas de anúncios de emprego, repletas com estágios não remunerados e outras formas de escravatura em pleno século XXI.

– provavelmente, nunca teve que passar um recibo verde, dois, três, …, mil!

E agora dizem: “ó António, não estás a exagerar?”

Sim. Estou.

Assim como os críticos da canção exageram ao dizer que quem gosta é tudo uma cambada de malandros.

Eu gosto da música, identifico-me com ela e não sou malandro, nem preguiçoso.

Estou no desemprego e não é por vontade própria, nem por falta de qualificações ou competências.

Aliás… é “engraçado”. Há uns anos atrás eu tinha qualificações e experiência a menos. Agora tenho qualificações e experiência a mais.

Por isso, estou com os Deolinda e com todos aqueles que estejam determinados a expor a vergonha que vai neste país, mas que alguns, para não perderem o status quo, querem ignorar.

Que merda!

Numa altura em que toda a gente diz que o país está mal e é preciso “fazer alguma coisa”, aparece alguém que através da música coloca o dedo na ferida, puxa pelas pessoas e incentiva-as a mexerem-se e o que acontece? Um grupo de betos pseudo-intelectuais-reaccionários vem dizer “ah e tal não…”

Cada um sabe de si e Deus sabe de todos.

Eu sei que não sou parvo, como os “parvos” (atenção que está entre aspas) que criticam uma das melhores canções de intervenção de sempre na música portuguesa…

Agora compreendo o que o Zeca Afonso deve ter sofrido no tempo dele…. Ufffff….

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.